sexta-feira, 16 de março de 2007

António Lobo Antunes - a obra

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Sobre a obra de António Lobo Antunes

A sua escrita nem sempre é fácil mas é colorida, forte e aliciante. Os livros deste escritor são entusiasmantes. O que mais admiro no autor é a capacidade que tem de pintar verdadeiros frescos de Portugal e dos portugueses. Os seus medos, os seus vícios, os seus desejos, as suas vitórias, afinal aquilo que somos. E tudo surge bem estruturado, parco em palavras mas de forma a que todas elas tenham um papel único e essencial. Pelos seus escritos perpassa um humor por vezes corrosivo, uma ironia que nos faz sorrir, rir e que também nos angustia
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“Quando chegámos de Trás-os-Montes o senhor doutor arranjou espaço no celeiro para nós, mandou colocar um tabique a separar-nos do milho, atamancámos um tecto para nos proteger dos morcegos que andam por aí a falar com voz de gente, pusemos o fogão a um canto, aproveitámos a pia da adega para as necessidade e lembro-me que no verão acordava no escuro e escutava as rãs do pântano, a insónia dos cães e o desassossego dos bezerros, o meu pai a ressonar o mesmo barulho que o moinho, via o candeeiro do doutor aceso no escritório, as laranjas brilhavam na paz de Agosto ardendo devagarinho como as lamparinas dos santos, e sentia-me bem, sentia-me eterna, sentia-me feliz dado que o tempo parecia parado para sempre e que ninguém ia morrer. De manhã as laranjas apagavam-se, o tractor começava a trabalhar…”

ANTUNES, António Lobo – O Manual dos Inquisidores: Publicações Dom Quixoter. Lxa., 1996


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