quarta-feira, 7 de março de 2007

Gabriel Garcia Marquez


(nos 80 anos de Gabriel Garcia Marquez)

"Santiago Nasar enfiou umas calças e uma camisa de linho branco, ambas por engomar, iguais às que vestira no dia anterior para o casamento. Era roupa janota. …………………………………………………………………………………………….
Quando saía ao monte levava à cintura um 357 Magnum, cujas balas blindadas, segundo dizia, podiam rachar um cavalo ao meio. No tempo das perdizes levava também os apetrechos da falcoaria. No armário tinha além disso uma espingarda 300 Holland Magnum, uma Hornet com mira telescópia de dois comandos, e uma Winchester de repetição. Dormia sempre como dormiu o pai, com arma escondida na fronha do travesseiro, mas antes de sair de casa naquele dia retirou os projécteis e pô-los na gaveta da mesinha-de-cabeceira. “Nunca a deixava carregada”, disse-me a mãe. Eu sabia disso, e sabia também que ele guardava as armas num sítio e escondia as munições noutro sítio bastante afastado, para que ninguém cedesse nem por acaso à tentação de carregá-las dentro de casa. Era um costume sábio imposto pelo pai desde a manhã em que uma criada sacudiu o travesseiro para tirar a fronha, e a pistola disparou-se ao embater no chão, e a bala escaqueirou o armário do quarto, atravessou a parede da sala, passou com um estrondo de guerra pela sala de jantar da casa vizinha e converteu em pó de gesso um santo em tamanho natural no altar-mor da igreja, do outro lado da praça. Santiago nasar, então menino, não esqueceu nunca a lição daquele percalço."..

MARQUEZ, Gabriel Garcia – Crónica de uma morte anunciada.Lisboa;Edições O Jornal (pags 9,10)

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